terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Aeroporto e Anjo da Guarda

Já afirmámos várias vezes por aqui, que as cidades são organismos vivos que se desenvolvem em ciclos de vida, atravessados por momentos de crises e prosperidades, sempre ancoradas no esforço e empenhamento colectivos daqueles que as habitam; não são, propriamente, fruto de vontades, vaidades, ou protagonismos individuais. Dizemos nós.
Também já reiterámos que há um sentimento de pertença a ligar o indígena ao lugar matricial, que não pode, nem deve, enviesar-lhe o discernimento, a pontos de romancear a realidade por entre inimigos imaginários, e desmandos paroquiais, como os que, amiúde, são trazidos a público no pasquim Interior. Escribas de pacotilha transformaram aquele semanário num vale de lágrimas, onde são manifestadas sentidas preocupações com a vizinhança do sul, estranhamente, com a designação Beira Interior; um conceito, segundo eles, cozinhado em prol da Covilhã, projectando-a, quiçá, para capital d’uma putativa região autónoma do interior luso. Bom! Esta é a parte quase séria. Deixemo-la assim.

A outra parte, mais do género ficcional, aporta um rasgo de inteligentzia doméstica, acabado de chegar à comarca por um estratega do desenvolvimento sustentado, que defende a localização do aeroporto regional na Guarda.
Não fora o tom sério, que o cientista pôs na defesa de tamanha empreitada, numa cidade a hibernar desde que o Senhor Sancho a fundou, e o mais incauto dos leitores pensaria tratar-se d’um delírio quixotesco: um Anjo da Guarda a vislumbrar aviões por entre vales e rochas nunca d’antes navegados. Foi, sem dúvida, um grande serviço prestado á urbe que, seguramente, ainda não se deu conta da importância que tem.
Podia o caro estratega, na sua douta opinião, defender uma rede de complementaridades entre as duas cidades, ou manifestar o seu desagrado perante a ofensiva do governo em encerrar o interior do país; mas não, deslizou alegremente para o despautério de fazer arribar à "capital" da Beira Alta, vá lá saber-se porquê, umas pistas de aviões para contentamento dos pacóvios. É a sua opinião. Prontos.
O que já não nos parece tão certo, é a forma como cai na banalidade de pronunciar um judicioso parecer sobre a matéria, que não está provado ser o que melhor defende a coesão regional. Muito menos a Covilhã.

Porque será?
Bom, foi coisa que o velho Marx nunca nos disse.

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